sábado, 30 de abril de 2016

Cemitério do Esplendor

O novo filme de Apichatpong passa-se nesta ligeira nuance da afirmação que os vivos podem estar mortos (ou adormecidos, neste caso) e que os mortos coabitam com o presente, que percorrem a terra como todos nós. E é o esplendor: uma cidade natal onde houve em tempos uma escola na qual o realizador estudou; uma escola que hoje é um hospital onde soldados dormem, sem energias; um hospital que se ergue sobre um cemitério e um cemitério que é também o palácio de um rei. Terra-décor omnipotente, no qual a vida e a morte são o mesmo circuito singular, no qual a ventoinha do ar e a moinho da água giram sem distinção. Ao espectador é-lhe revelado o segredo dos super-heróis: ver e ouvir, mais e melhor. 

sexta-feira, 29 de abril de 2016


domingo, 24 de abril de 2016

Se há um símbolo que representa Apichatpong Weerasethakul (e o seu cinema) é este: uma árvore iluminada.

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Verhoeven


Começou ontem a retrospectiva de Paul Verhoeven no indie e quem não tiver mais do que fazer pode ler aqui o texto que escrevi sobre o evento.

Já à conversa em torno da sua obra, que vai ter lugar a partir das 17:30, no dia 26 de Abril (terça-feira) no cinema São Jorge, estão obrigados a comparecer. Ela contará com a presença dos ilustres Luís Miguel Oliveira  e Vasco Câmara, críticos do jornal Público, e Vasco Baptista Marques, do jornal Expresso. A moderação ficará a cargo deste vosso humilde servo. Até lá!


quarta-feira, 20 de abril de 2016


segunda-feira, 18 de abril de 2016

La rose et la merde


domingo, 17 de abril de 2016

Ele caga dinheiro

Pormenor do Inferno pertencente ao tríptico de
Hieronymus Bosch "O Jardim das Delícias Terrenas". 

sábado, 16 de abril de 2016

Convidados #Lisbon Talks

A Internet como forma-cinema 
22 de Abril (sexta-feira), 18h00-19h30, Cinema São Jorge, Sala 2
Moderador:
Ricardo Vieira Lisboa (À pala de Walsh)
Convidados:
Afonso Mota (realizador)
Tiago Baptista (investigador)
Marta Pinho Alves (investigadora)
Intervenção Skype de Kevin B. Lee (crítico vídeo-ensaísta)
A crescente a cada vez mais constante presença de ecrãs, assim como as estruturas em rede da informação digital vêm-se infiltrando na matéria de cinema, nos seus temas e preocupações, mas também, e de modo mais revolucionário, na própria forma dos filmes: a sua arquitectura interna, a origem das suas imagens e o seu tratamento. Uma conversa sobre o cinema de desktop, a cultura dos clips, dos loops e dos gifs, dos links e das redes sociais.
Verhoeven, o independente megalómano
26 Abril (terça-feira), Cinema São Jorge, Sala 2

17h30-19h30 –  Projecção do documentário Tricked: Paul’s Experience. Mais conversa:
Moderador:
Carlos Natálio (À pala de Walsh)
Convidados:
Luís Miguel Oliveira (crítico do Público)
Vasco Baptista Marques (crítico do Expresso)
Vasco Câmara (crítico do Público)
Há quem olhe Paul Verhoeven como um cineasta malabarista que tanto conseguiu o sucesso no seu país como conseguiu infiltrar-se na máquina de Hollywood e fazer grandes sucessos de bilheteira, sem perder a sua frontalidade e ironia e agora regressou ao cinema europeu como autor consagrado. Verhoeven é sem dúvida o mais megalómano dos independentes.
Televisão: o novo cinema?
27 Abril (quarta-feira), 18h00-19h30, Cinema São Jorge, Sala 2
Moderador:
Luís Mendonça (À pala de Walsh)
Convidados:
António Borges Correia (realizador)
José Marmeleira (crítico do Público)
Nuno Artur Silva (administrador da RTP)
Partindo da febre recente pelas séries televisivas, questionamo-nos se a televisão é o novo cinema, se o contém, se está dentro dele, se nada disso ou o seu contrário. Também procuramos descobrir, inversamente, se o cinema se está a tornar televisivo e a caminhar para a serialização. Uma conversa que partirá de um ponto de vista nacional.
Um novo cinema independente norte-americano
29 Abril (sexta-feira), 18h00-19h30, Cinema São Jorge, Sala 2
Moderador:
Ricardo Vieira Lisboa
Convidados:
Jorge Mourinha (crítico do Público)
Robert Greene (realizador)
Intervenções Skype de Geoff King (investigador) e Girish Shambu (crítico online)
Uma nova força no cinema independente norte-americano parece identificar-se, consequência dos modos de financiamento alternativos e da redução progressiva dos custos de produção. O cargo de realizador já não é uma posição, os postos vão mudando de projecto para projecto e os filmes resultam de uma rede de profissionais e amigos trabalhando à vez.
Por uma política dos actores
30 Abril (sábado), 18h00-19h30, Cinema São Jorge, Sala 2
Moderador:
Francisco Frazão (programador de teatro da Culturgest)
Convidados:
Gonçalo Waddington (actor e realizador)
Joana Barrios (actriz)
Vincent Macaigne (actor e realizador)
Os pontos que aproximam e afastam o teatro do cinema são muitos e já muito explorados, no entanto, quando Vincent Macaigne é o Herói Independente há que questionar a presença de um corpo como marca autoral. Assim, uma conversa sobre uma política dos actores impõe-se: as diferenças de método, a influência do actor na leitura dos seus personagens, a abertura dos realizadores a outras formas de autoria.

sexta-feira, 15 de abril de 2016

Starship Troopers

O tempo, como um supremo argumentador, tira-nos a razão a toda a hora. Quantas vezes as certezas da juventude são escovadas lentamente, removendo o sarro da assertividade cega?
Dito isto, pensava que ia acontecer essa mesma “ascese e depuração” quando revisse agora Starship Troopers. Mas não. Não gostei quando era miúdo (não me lembro das razões) e continua a achá-lo fraco agora.
Ou talvez ainda mais fraco agora, pois os termos de comparação aumentaram. E a metáfora do autoritarismo, da fascismo embrionário e latente naquela sociedade do futuro - umas das razões pelas quais o filme é hoje revisto com olhos de fada -  apenas se ergue como uma metáfora-monolíto imobilizante, secando tudo o mais.
Não estamos, como se ouve muito, na pura auto-paródia. Além das mais evidentes sequências televisivas e, admito, algumas outras peripécias mais rocambolescas, há a necessidade de estruturar uma matemática narrativa (aos trios, onde se devem encontrar os pares) séria.
A higiene da cara laroca dos actores, a violência sem os problemas das pessoas por baixo (como em RoboCop, por exemplo), as cenas de sexo sem sexo, o excesso removido a pinças, fazem de Starship Troopers um bug no próprio cinema de Verhoeven.
Nunca nenhum filme dele foi tão senhorial, tão portador de uma bandeira e afinal de contas limpo, sem contradição.
Entrar no cérebro de Verhoeven, como entrar no cérebro do insecto pensante (para compreender a lógica de actuação de ambos) apenas produzirá medo no lobotomizado e falsos sentimentos de controlo no autor dessa invasão. Afinal de contas, numa guerra, o oprimido finge sempre ser uma coisa que não é. Mas isso já tínhamos nós percebido com Jennifer Jason Leigh em Flesh + Blood

quinta-feira, 14 de abril de 2016

De vierde man


De vierde man de Paul Verhoeven é sobretudo uma alegoria hitchcockiana sobre o poder castrador do feminino face à psyche homossexual (poucos anos antes, a tesoura que aqui corta a pila no sonho do escritor ainda era o zipper que entalava o membro de Rutger Hauer em Turks Fruit).

Uma alegoria que mostra o homem na teia da aranha da mulher, assim como o espectador se afirma como a mosca da predação no cinema de Verhoeven.
Depois há contudo que contar com a angústia metafísica das visões: Jeroen Krabbé como Victor Sjöström em Smultronstället (Morangos Silvestres) e a teia do cristianismo, que ora salva ora enlouquece, como com Harriet Andersson em Såsom i en spegel (Em Busca da Verdade).
A seguir a Hitchcock (aquela tesoura… aquele gaivota morta… aquele soutien… sobretudo aquela chave-pistola) e depois de Bergman, só resta dizer que no fundo De vierde man é a antecipação de Basic Instinct em quase dez anos.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Self-cultivation


Aesthetic self-cultivation, no less than universal affluence, is an evident absurdity in today’s neoliberal world where «only the strong survive». Self-cultivation requires a climate of leisure and indolence that is incompatible, as Jonathan Crary puts it, «with the demands of a 24/7 universe». Self-cultivation is a kind of reflexive turning inward; as such, it is the opposite of self-branding, where I stylize myself in order to market myself, to be an entrepreneur of myself, and to increase the value of my «human capital». Self-cultivation is unthinkable under our current condition of austerity, where everything must be made subject to market competition and judged exclusively in terms of financial profit that it is able to yield under stringent constraints. From an outside perspective, it is quite bizarre that we take the «discipline of the market» so much for granted, while w laugh at the supposed naiveté of Fourier’s intricate calculus of passions and pleasures.
Shaviro, Steven, No Speed Limit: Three Essays on Accelerationism, p. 50, 51.

terça-feira, 12 de abril de 2016

Não recordava o sangue

Ontem quando revia o Robocop lembrava-me vagamente daquela cena em que fazem a apresentação do robot  ED-209. Sabia que algo ia correr mal e que ia matar uma pessoa, por erro de funcionamento. Mas longe estava de me recordar do banho de sangue que aquilo é. O que acaba por entusiasmar Sherlock e Freud ao mesmo tempo. Ou seja, eu não me lembro da violência mas ela, para um miúdo de oito anos, foi como uma tatuagem directa no cérebro. E depois claro podemos falar dessa poesia louca da violência como uma das razões pelas quais este filme, mas também Total Recall ou Basic Instinct, não se escoaram simplesmente pelo ralo do tempo. O picador de gelo a perfurar jugulares, a mão de Peter Weller que rebenta com um tiro de caçadeira ou os braços de Michael Ironside que ficam nas mãos de Schwarzenegger, decepadas por um elevador, são apenas alguns exemplos da demência permitida naqueles tempos por outros loucos, de companhias como a Orion Pictures ou a Carolco Pictures.

Estes exemplos são do domínio de uma poética da violência. Ela não corresponde nos filmes de Verhoeven a um ideal de transgressão. Quanto muito de diversão. Já a transgressão da violência hoje tornou-se uma norma reguladora, ninguém fica chocado pois ir “além de” é o que se espera de um sistema que tem de se expandir conquistando novos espaços de captação. E esses novos espaços são as supostas “transgressões” vertidas em normas, camufladas de espaço fora da redoma.
Mas curiosamente nestes filmes, em que o sangue é menos regulado (ou menos politizado), não é a violência o que perdura. Ela apenas acrescenta um toque kitch a uma audiência que já sabe ler as conservadoras normas dos crimes e das vísceras. O que perdura é esse sentimento de ambiguidade:
Louras ou morenas? Memórias artificiais ou realidade? Criminosa ou inocente? Humano ou máquina? 
Estes dualismos Verhoeven trabalha até à exaustão, literalmente até à última imagem, fazendo com que o movimento emocional destes filmes cometa o verdadeiro crime sanguinolento sobre o espectador. O que lhe dá o golpe da incerteza, do espaço entre o meio sentado no sofá e o meio de pé.
O beijo final entre Arnold e Rachel Ticotin em Total Recall – What if this is a dream? / Then kiss me quick before you wake up. – termina com um fade to white, mantendo vivo o espaço da alternância entre o único e o espaço de recall ad aeternum. 
A cena de sexo final entre Sharon Stone e Michael Douglas em Basic Instinct é a suprema ilustração do movimento orgásmico como passagem da pequena morte à grande morte. Os movimentos são sustidos até à última, escondendo sempre, até revelar. Revelar que a «fuck of the century» não é outra senão um gigantesco mind fucking.
Os instantes finais de Robocop também são este rodopio entre o biológico como bug do artificial e as imposições deste sobre a memórias e acção humanas. Robocop está outra vez entre uma loura e uma morena (Nancy Allen e a mulher dele) mas o seu programa não lhe permite recordar desta última. Quando lhe é dada permissão para por um ponto final à ameaça principal em Detroit, fica a impressão que Murphy poderá voltar a casa. Mas como?
Estas aberturas da narrativa são, como parece evidente, as grandes pancadas destes três filmes. Foram elas que me atingiram entre os 7 e aos 12 anos. De tal forma que o sangue, por muito vermelho que tivesse sido, o esqueci por inteiro. Lembra-me isso sim, da dúvida, do momento em que…

sábado, 9 de abril de 2016


Nem seja tão exigente com os outros; as aparências iludem; não faça aos outros aquilo que não quer que lhe façam a si; tudo depende do contexto.
Escolha um ou mais destes dizeres populares e substitua por Urok (A Lição) poupando-se a si próprio 1h51 minutos da sua vida. Ou então faça como eu, consuma essas quase duas horas e depois demorará outro tanto para tentar desfazer-se do que (des)aprendeu.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Auto-sabotar o gosto

So, how do we put into action the auto-skepticism of our own taste? How do we attempt to enter or re-enter films in a way that extends our taste in new directions and deepens our appreciation of films we already love? One thing is clear: we cannot do it without new ideas.
Girish Shambu in The New Cinephilia (2014)

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Palas


terça-feira, 5 de abril de 2016

L’ombre des femmes (2015) de Philippe Garrel

À Sombra das Mulheres. Poderoso título que Philippe Garrel chama para o seu último filme. Poderoso pois podia bem ser todo o seu cinema que se comprime ante esta premissa, ou antes, um dos seus problemas estéticos: de que é feita a sombra que emana da figura das mulheres e atinge em cheio o corpo e psique masculinas?  Neste seu filme está em causa esse afrontamento, expresso no rosto inexpressivo e corpo incapaz de abraçar e mostrar amor, de Stanislas Merhar. Pierre é a figura típica do amante garreliano, num desespero surdo pós-nouvelle vague e que está sempre preso nessa sombra. Sombra que tal como com as “suas” mulheres são duas. De um lado, a companheira de há anos, com quem faz filmes e vive uma vida no limiar da pobreza, e do outro lado, a amante, jovem estagiária numa produtora de cinema, estudante de doutoramento. Mas essas mulheres são os desdobramentos do problema da sombra. É a sombra feminina como o espaço da “influência sobre”, como as sereias que cantam aos marinheiros de Ulisses, mas também a sombra como o porto de abrigo contra uma intensa luz do real.

Mas como referi, nada disso é muito novo, pois o luto das relações, o nascimento dos amores, as infidelidades, os ciúmes, sempre compuseram grande parte da cartilha dos “estudos garrelianos”. Mas então o que muda, ou por outra, o que evolui no cinema de Garrel? A resposta talvez tenha de se começar a procurar na curta duração de L’ombre des femmes (À Sombra das Mulheres, 2015), 73 minutos [algo que já vem do seu anterior filme La Jalousie (Ciúme, 2013), 77 minutos]. Filme curto, depurado, mas cuja explicação fica, creio, aquém de um traço característico do cinema do francês: a economia de meios. Esta simplicidade  – pela qual se depuram os espaços da sua beleza, pela manutenção apenas do que é vital, as escadas, as camas, os breves passeios e as palavras essenciais – faz parte de um gesto de frontalidade.
Costuma dizer-se que Garrel sempre trabalhou no limite do home movie, que sempre buscou na máxima simplicidade, uma qualquer verdade essencial da intimidade e do drama. Isso não deixa de ser um facto aqui mas a brevidade parece também provir de um movimento autobiográfico (que sempre esteve no cinema de Garrel) aqui despindo-se lentamente dos “desvios” que o aspecto familiar e pessoal trazia. Não é por acaso que o seu filho, Louis Garrel, é aqui puxado para fora de campo, numa vozoff absolutamente linear e sem paixão. Não deixa de ser verdade que essa crueza advém em parte de um olhar maduro e desencantado sobre a vida, sobre uma perda de minutos atrás de minutos, que nem o amor ou as reconciliações apaziguam.
Se há de facto esse caminho da perda de adjectivos para a vida – ou a sua frontalidade, dirão alguns – há também uma certa compressão substantiva de um olhar linear, adulto, sem floreados. É a dimensão documental de L’ombre des femmes. Ao espectador fica essa dúvida no ar. Que documentário está de facto a ser filmado? Um sobre um veterano resistente francês ou um sobre as rupturas e continuidades de uma relação amorosa? Qual a verdadeira Resistência “militar” inerente ao amor? O que vale mais: o herói impostor ou o cobarde sincero?O argumento, fruto da colaboração com Jean-Claude Carrière, parece permitir todas estas ambiguidades.
Frequentemente se escreve que todas os documentários são ficções. Já o contrário é menos comum mas parece que L’ombre ameaça dizer-nos algo nessa direcção.Como se finalmente o cinema de Garrel fizesse evoluir o autobiográfico a um ponto onde ele se tornasse documental, deixando ver que o outro lado do íntimo e pessoal é o registo da observação do mundo todo. Não é que Garrel seja propriamente os irmãos Lumière mas há de facto a sensação que estarmos a assistir a um documentário sobre a natureza e evolução das relações amorosas. Ou seja, por dentro tudo nos diz: “sim, é mesmo assim que tudo se passa.” E não há como não sair abanados pela crueza disto tudo. Pelo facto de todas as distracções estéticas (e outras) se terem ido e só termos ficado com isto: algo tão fiel mas ao mesmo tempo sem escapatória…

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Interact

Para terminar (por agora) a ronda de despudorada auto-promoção deixo-vos mais um texto. Desta feita, o Editorial ao novo número da INTERACT sobre  «Cinema, Crítica Digital e Ensaio Audiovisual» que a partir dos próximos meses terá muitos e bons textos/vídeos editados por mim e pelo Luís Mendonça.

sábado, 2 de abril de 2016

La Furia Umana 27


Depois de um filme falado, eis que escrevo qualquer coisinha mais séria sobre este The Knight of Cups, de Terrence Malick para a última edição da revista La Furia Umana.

sexta-feira, 1 de abril de 2016